Preço de stent para o coração varia de R$ 1.200 a R$ 38,5 mil no país

A variação de preços de um mesmo stent coronário chega a 3.108% dependendo da região do país, revela estudo inédito da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Em um hospital privado de Minas Gerais, ele custou ao plano de saúde R$ 1.200. Já em Sergipe, o mesmo produto foi vendido por R$ 38,5 mil. Na ponta final, quem arca com essa distorção é o usuário do plano de saúde, já que o aumento da mensalidade levará em conta o aumento de custos da operadora.

Embora diferenças de preços das próteses sejam esperadas, por fatores como logística, tributação e poder de negociação, essa discrepância pode estar ligada a condutas antiéticas ou ilegais.

Segundo especialistas do setor, isso ocorre porque há falta de regulação e de transparência nas informações.

Desde janeiro de 2015, a Polícia Federal investiga situações em que médicos e hospitais recebem comissões para que utilizem próteses de determinadas empresas no tratamento de pacientes.

Em alguns casos, cirurgias são indicadas sem necessidade ou sabotadas para que pacientes sejam reoperados e, com isso, gerem mais lucros. Em setembro, 13 pessoas foram presas numa operação da Polícia Federal no Distrito Federal, entre elas sete médicos de um hospital privado.

O relatório, que será divulgado nesta quinta (15), é parte do trabalho de um grupo –que envolve vários ministérios, órgãos reguladores e entidades da saúde– que discute medidas para aumentar a transparência e o controle sobre esses produtos.

O mercado nacional de produtos médicos movimenta por ano R$ 19,7 bilhões, dos quais R$ 4 bilhões (cerca de 20%) são de órteses e próteses. Hoje, consomem 10% do total das despesas assistenciais dos planos de saúde.

Somente agora, com a ação do grupo intersetorial, é que esses dispositivos médicos começam a ter padronização das nomenclaturas, por meio da qual será possível a comparação de preços.

"A mesma prótese podia ser comercializada de diversas formas. Isso dificultava a transparência e facilitava ações irregulares", explica Martha Oliveira, diretora de desenvolvimento setorial da ANS. A partir de 2017, os preços das próteses estarão divulgados no site da agência.

Para Francisco Balestrin, presidente da Anahp (associação dos hospitais privados), o relatório mostra o quanto o mercado está "muito desarrumado". Segundo ele, são necessárias mudanças em toda a cadeia, "sem ganhos e perdas para nenhum dos lados".

"Hoje, em algumas situações, o médico ganha [com comissões das próteses] tanto quanto os hospitais."

REMUNERAÇÃO
Para Paulo Furquim, professor do Insper, o caso das próteses é a ponta do iceberg de um sistema de saúde repleto de distorções e de um modelo de remuneração que premia a quantidade e não a qualidade do serviço.

"Medidas pontuais para o caso das próteses podem não ser eficazes e, certamente, vão deixar muitos dos problemas existentes sem solução."

Segundo Martha, há um outro grupo dentro da ANS discutindo a mudança do modelo de remuneração de modo a valorizar o desempenho e não mais a quantidade de procedimentos feitos.

Uma outra ação da ANS foi a criação de um guia para o paciente que recebe essas próteses. É uma espécie de roteiro de perguntas para entender os cuidados que deve tomar após a alta hospitalar.

As perguntas abordam desde o que foi implantado no corpo da pessoa, como funciona o dispositivo e se o aparelho precisa de manutenção.

"Todo mundo lê a bula de medicamento. Com as próteses, não havia informação. A pessoa vai carregar a vida toda, mas não sabe se precisa trocar a pilha, por exemplo."

Fonte: Folha de São Paulo